Introdução
O pletórico desenvolvimento doutrinário relativo ao estudo do desenvolvimento econômico revela, em sua análise, diversos pontos de vista, às vezes conflitantes em temas basilares da ciência econômica. Percebe-se, outrossim, que diversas condicionantes influenciam a compreensão do assunto. Devemos, portanto, ao desenvolver cada aspecto, estabelecer as opiniões divergentes relevantes, emitindo, invariavelmente, juízos de valor. É nesse tópico que vemos a importância da exemplificação e comparação entre os diferentes modos de desenvolvimento dos Estados. A complexidade do estudo reside na crítica pessoal. Os leitores, ao vislumbrarem as opiniões político-econômicas, já, previamente, estão eivados de conceitos, ou melhor, dizendo, pré-conceitos, que inibem ou mitigam a formulação do raciocínio econômico.
O desenvolvimento econômico é um processo ínsito às sociedades humanas, independe de seu estudo e sua compreensão, aos grupos humanos, para realizá-lo. A disseminação do capitalismo pelo mundo e sua massificação possibilitou o desenvolvimento da ciência econômica, essa, então, procurou estudar o desenvolvimento a partir dos pilares capitalistas. Inseparável, portanto, da análise econômica a compreensão histórica do desenvolvimento econômico.
Características que Inibem o Desenvolvimento Econômico
A partir do ponto em que se considera o desenvolvimento econômico como objetivo a ser buscado inexoravelmente pela sociedade, ou melhor, pela humanidade como um todo, tem-se, assim, visando tal objetivo, fatores que – a despeito das diferentes concepções ideológicas – prejudicam o crescimento e o decorrente desenvolvimento da sociedade.
Num primeiro plano, vislumbramos como um fator – lato senso – mitigador de desenvolvimento a cultura. Por cultura, entendemos, nesse caso, tratar-se dos pressupostos comportamentais, decorrentes da formação do país, de todas as influências que plasmam o ser humano como cidadão de uma nação. A cultura de um país é, provavelmente, o maior agente no crescimento e desenvolvimento econômicos (positivamente e negativamente). As diferentes culturas com as quais convivemos hodiernamente, desenvolvem-se de maneira diferente, podemos dizer que em estágios diferentes. Não queremos, entretanto, estabelecer um determinismo atávico intrínseco a determinado povo; salientamos, apenas, que a partir do momento que estabelecemos prioridades e meios de analisar o desenvolvimento econômico (parâmetro), podemos comparar diferentes Estados e apontar os aspectos negativos e os positivos nas entranhas do volskgeist.
Estados teocráticos ou com certa rigidez religiosa vislumbram, em geral, o desenvolvimento de maneira mais conservadora, não o impede, mas o asfixia quando amalgamado ao sistema de concorrência globalizado. Logo, dentro do conceito amplo de cultura, a religião pode constituir-se em um fator importante no desenvolvimento econômico, obviamente, se esse desenvolvimento é compreendido com os parâmetros usuais que auferem o crescimento econômico aliado às taxas de analfabetismo, expectativa de vida, etc.
Outro fator fundamental na análise dos fatores negativos em relação ao desenvolvimento de um povo é o Estado. Neste ponto as divergências são, evidentemente, enaltecidas, pois o Estado abrange fatores positivos e negativos que não corroboram de unanimidade dentro da doutrina na maioria de suas características. O Estado é um fator extrínseco ao ser humano, porém, interpenetram-se as características culturais da comunidade supra referidas ao seu modus operandi, de tal forma que em muitos aspectos o Estado reflete o homem, mas não faz parte dele. Logo, o Estado é um agente autônomo no processo de desenvolvimento.
A grande contenda em relação a responsabilidade estatal reside nas funções do Estado, mormente se ele deve executar e controlar muitas tarefas dentro da sociedade, ou se deve ele abster-se e agir excepcionalmente. Na economia, a discussão preconiza uma perspectiva de efetividade, ou seja, se há equilíbrio e eficiência quando o Estado age, ou se ele distorce negativamente a economia como um todo. Vivenciamos um período de legitimação de direitos, de hipertrofia jurídica, onde o Estado já deixou de ser coadjuvante, para atuar como protagonista no desenvolvimento social e, naturalmente, no desenvolvimento econômico.
Cremos que o excesso de funções, ou melhor, a morbidez crônica do Estado é um fator preponderantemente negativo. Essa característica, para nós, patológica, de exacerbação das funções e responsabilidades estatais corrompe a economia e, subsidiariamente, o cidadão, que se tornará um meio-escravo, um servo de uma instituição que nasceu para servi-lo. Ou, sinteticamente, nas palavras de OLIVA e GUERREIRO (p. 13, 2006), “[...] a evidência histórica mostra que a hipertrofia do Estado gera um grau de ineficiência econômica muito grande e provoca o encolhimento do potencial de ação dos agentes sociais.” Tal ineficiência é resultado de um excesso de alocação de recursos entre os contribuintes e um desperdício na utilização dos mesmos. O Estado enfraquece o poder de consumo da população, visando a incrementação em bens mais importantes para a coletividade, entretanto, seus problemas fisiológicos, sua administração letárgica, o meio como ele é constituído (priorizando políticas imediatistas, de cunho eleitoreiro) promovem a desvirtuação na utilização do Erário e o péssimo manejo desses recursos. O resultado, naturalmente, é sentido no crescimento e no desenvolvimento econômicos. Mais adiante, analisaremos os aspectos positivos da atuação estatal no desenvolvimento.
Outros agentes importantes que exercem sua influência no desenvolvimento de um povo é o comércio exterior e as relações com outras nações. O comércio exterior, via de regra, constitui-se, para nós, como um fator positivo, porém, muitos autores a consideram um fator de dependência e subjugação a outros povos. BENAYON (p.44, 2005) defende que os investimentos diretos estrangeiros são os responsáveis pelas políticas de dependência que os centros econômicos se utilizam para lucrar nos países em desenvolvimento (periferia):
Essa é uma lição para os que imaginam ou fingem crer que grandes capitais são necessários ao desenvolvimento. [...]. Os que a desencadearam o fizeram com muito pouco capital no início. Não assiste, pois, razão alguma aos propagandistas dos “investimentos” diretos estrangeiros (IDEs). [...]. Os hospedeiros tornam-se mais pobres. [...] Nada é mais prejudicial à economia de um país que se juntar ao centro mundial ou ter com ele boas relações.
Finalmente, não podemos olvidar os fatores geográficos, ou seja, as características naturais que podem gerar as “vocações” dos países para certos meios de produção. Países com uma extensa costa marítima, por exemplo, têm vantagens naturais para certos empreendimentos: a pesca, a navegação facilitada para exportações, etc. O clima e as características geográficas exercem, portanto, efeitos no desenvolvimento de uma nação, exemplos não faltam: o agro-negócio, a pecuária, a extração de minérios, de petróleo, o turismo, etc. Logo, depreendemos disso que os países com características naturais “deficientes” (terra não propensa a agricultura, regime climático prejudicial, dificuldade de transporte, etc) estão em desvantagem na busca pelo desenvolvimento. No próximo item analisaremos que esse fato (ausência de boas condições naturais) pode ser um fator “positivo” para o crescimento de uma sociedade.
Características que Promovem o Desenvolvimento Econômico
Acordados em relação ao que nos parece ser desenvolvimento (mormente o resultado do crescimento econômico, que gera o desenvolvimento lato senso – sinteticamente, a qualidade de vida, o welness), podemos considerar os motivos pelos quais os Estados se desenvolvem, os motores do desenvolvimento.
Como já salientado, anteriormente, a cultura nacional estabelece sua influência sobre todos os âmbitos de atuação humana, transformando, também, o processo de desenvolvimento econômico. Notamos que os pressupostos comportamentais já estabelecidos moldam o caráter do ser humano na busca de seus objetivos e repercutem na ação humana. Para BENAYON (p. 94, 2005) é indispensável o elemento cultural, visto que dele decorre um bom governo, uma elite inteligente capaz de orientar a nação:
[...] extraem-se as seguintes lições: há um só modelo de desenvolvimento, que se caracteriza pela precedência dos elementos espirituais e éticos. Sem esses, não há como produzir a harmonia e a coesão do todo social indispensáveis ao processo. O modelo supõe à frente do Estado uma elite criativa, educada e educadora, a mesma que o dirige, com estratégia própria[...]
Podemos dizer, v. g., que certas culturas privilegiam mais a iniciativa privada, a busca pelo crescimento pessoal. As instituições desse povo (o direito, por exemplo) estarão mais condizentes com os fatores desenvolvimentistas.
As relações externas do Estado, mormente o comércio exterior, são extremamente necessárias para o desenvolvimento pleno de um país. Tendo em vista o mundo da produção globalizada, não podemos imaginar um Estado que se desenvolva ser manter relações saudáveis com outras nações. Pode-se contrariar o argumento internacionalista afirmando que inúmeros Estados se desenvolveram, a priori, a partir do mercado interno, do crescimento dos fatores produtivos sem a interferência exterior. Contrapomos esse argumento ao indicar que num plano desenvolvimentista atual – vide os países em desenvolvimento – é impensável a satisfação da demanda de um país capitalista exclusivamente pela produção interna. Assim, se bem orientado, o comércio exterior é fundamental para o desenvolvimento econômico. Não convém, portanto, a adoção da teoria da dependência, pois, para nós e para muitos autores os países em desenvolvimento podem se desenvolver normalmente, a despeito da relação com as grandes economias (o avanço do BRIC demonstra claramente os equívocos da famosa teoria).
Protagonista e antagonista nesse fenômeno da evolução econômica da sociedade é o Estado. O Estado, constituído pela necessidade de organização social, é promotor de desenvolvimento, se bem gerido. Quando concentramos recursos da produção nacional em uma instituição que objetiva o bem comum, pode-se criar inúmeros fatores de desenvolvimento. A incrementação da infra-estrutura, o zelo pelos direitos mais fundamentais do cidadão – como a propriedade, a segurança, a efetividade da jurisdição, a melhoria da educação são alguns dos incontáveis meios de promoção do bem-estar que o Estado pode concretizar. O alto poder de investimento que o Estado tem permite o estabelecimento de obras que o simples cidadão ou mesmo a mais poderosa corporação não teriam condições de constituir ou não teria o real interesse (no caso, o lucro para a empresa). Tememos, entretanto, a tendência atual de relegar ao Estado as mais diversas funções, que por ora não cabe ao Estado, seja pela sua ineficiência crônica, seja pela total inviabilidade de execução. O Estado deveria ser organizado calcado, principalmente, em três critérios, como bem definido por OLIVA e GUERREIRO (2006, p. 31):
Os deveres que ao Estado cabe assumir precisam ser definidos com base em três critérios. O ético estatui que no campo da ação a propriedade é do indivíduo, incumbindo ao Estado fazer apenas o que é coletivamente relevante e que não tem como ser feito pelo cidadão. O critério econômico define quanto a sociedade agüenta pagar para manter em funcionamento um Estado de boa qualidade. E ao critério político cabe estipular os mecanismos de como cobrar eficiência gerencial na aplicação do dinheiro público. A concepção defensável de Estado não pode deixar de levar em conta esses três aspectos. Não diminuir o espaço de atuação individual, não introduzir custos que asfixiem a economia e exibir proficiência na alocação de recursos e oferta de serviços – eis o que se exige de um Estado voltado para servir à sociedade e não a si mesmo. Do contrário, será especiosamente apresentado como fonte de solução para os problemas que ele mesmo gera. (Nosso destaque)
Por fim, novamente ressaltamos que além das condições geográficas naturais poderem prejudicar o desenvolvimento, podem, igualmente, promovê-lo. Embora a abundância natural de determinado território resultar em facilidades no processo de desenvolvimento e produção, pode a abundância ser “negativa”, ou mesmo, a carência de provimentos naturais ser positiva, como veremos. A Venezuela tem uma das maiores reservas de petróleo do mundo, conseqüentemente, o petróleo constitui o principal produto de exportação e geração de renda aos venezuelanos. Ordinariamente, podemos afirmar que esse fato é inteiramente positivo à sociedade daquele país. Embora, o petróleo gere riquezas ao povo venezuelano, ele desencadeou, ao mesmo tempo, uma grande dependência dessa fonte de renda, mitigando o desenvolvimento de outros setores, e tornando o país refém da demanda internacional do produto. A Venezuela tem combustíveis baratos, entretanto não consegue nem suprir o mercado interno de alimentos com eficiência dado o arcaísmo da agricultura (resultado da cultura de importação financiada pelo petróleo).